Os Mortos estão de Volta - Carta Verde

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terça-feira, 5 de setembro de 2017

Os Mortos estão de Volta



Em "As Crônicas dos Mortos", obra escrita pelo autor até então desconhecido Rodrigo de Oliveira, somos jogados em um cenário pós-apocalíptico mundial, onde os mortos vivos caminham sob a terra. Ignorando a máxima moral que os outros escritores adotam, Rodrigo decide abordar desde o início da destruição da humanidade até a ascensão dos mortos, onde nem mesmo a figura mais importante do país, presidente Dilma Rousseff, escapa do horroroso fim que os mortos reservam para todos os humanos: estraçalhamento.
Além disso, Rodrigo inova por recorrer ao solo brasileiro como ambiente de sua história, estabelecendo uma proximidade do leitor àquilo que já conhece.

Antes de tratar realmente da obra em questão, é de suma importância frisar algo que a maioria dos fãs de terror e do gênero de zumbis em específico já conhece: é muito difícil inovar quando falamos de mortos vivos que devoram pessoas. Desde o início da década de 60, o tema de seres que comem cérebros já iniciava nos cinemas e nas obras literárias, criando, dessa forma, um mercado quase que completamente saturado.
Raras exceções surpreendem quando falamos no assunto, tendo como destaque a série de TV inspirada nos quadrinhos "The Walking Dead".
A partir de então, o drama vivenciado pelas pessoas passa a ser tomada como base, e a inclinação ao terror já não é mais tão presente, beirando (no máximo) ao suspense.



Partindo de tais observações, eu gostaria de destacar algo que me chamou muita atenção enquanto lia o livro. A primeira sensação que tive era que estava em alguma espécie de pesadelo ou algo parecido, o que até faz muito sentido quando analisamos as próprias palavras do autor, quando ele diz que teve a ideia de escrever o livro à partir de um pesadelo que teve depois de assistir o filme "Madrugada dos Mortos".



Logo no início do livro nós conhecemos a família de Ivan, um homem que trabalha na área de ciência da computação na cidade de Taubaté. Ivan mora junto com sua esposa e seus dois filhos. Até então nada surpreende, apenas uma família normal com uma vida normal.
Por fim nós nos deparamos com o início da infestação zumbi, quando um enorme cometa passa muito perto da terra e, como sugestiona o próprio narrador, carrega consigo as almas da maioria da população do planeta, deixando para trás somente os seus corpos.
Enquanto eu lia tal explicação eu ficava me questionando se realmente havia alguma necessidade de expor a forma como acontecia a transformação dos zumbis. Ainda que eu prestigie a história por fazer essa conexão entre ficção e religião, com direito a passagem da Bíblia, a grande questão continua solta: seria esse um modo mais trabalhoso ou preguiçoso de tratar tal questão?
Deixo isso para vocês refletirem.



Outro fator que me chamou bastante atenção e eu, particularmente, adorei foi o modo como o ambiente político do drama não fica como plano de fundo do tema central. Afinal, quando falamos de quaisquer narrativas pós-apocalípticas nós queremos justamente observar os impactos que tais catástrofes causam nos nossos personagens e como isso afeta a maneira de agir e pensar deles. Os sentimentos e os desejos dos personagens são muito bem explorados, principalmente durante o arco da guerra entre os sobreviventes de Taubaté e os prisioneiros que dominaram a prisão.
Estela, esposa de Ivan, é uma das pessoas mais fortes do condomínio onde vivem os sobreviventes, e marca um ponto na linha de badass da história, além dos outros personagens secundários e antagonistas, que vivem cenas desesperadoras e agonizantes, ao estilo George Romero. Com exceção de Ivan - comento isso mais à frente -, a fidelidade do escritor na transmissão dos sentimentos de seus personagens é simplesmente incrível, o que garante a empatia com a maioria deles e faz com que você não consiga mais largar o livro, esperando por seus diálogos.



Acontece que as coisas ficam um pouco diferentes quando tratamos do personagem principal da história, Ivan. Como colocado anteriormente, Ivan é alguém com cerca de quarenta anos e trabalha na área de computadores. Desde o início da história nós compreendemos o ponto de vista do personagem e entendemos que a sua maior motivação é justamente garantir a segurança de sua família, custe o que custar. É até normal aceitarmos um personagem com tais pensamentos, uma vez que lembremos que Ivan é um pai antes de tudo, e o ser protetor está sempre operante. Porém, o que realmente cansa, com o passar das páginas que você lê, é o modo como esse senso de justiça e de proteção toma proporção, criando uma caricatura completa de um personagem idealizado. No fim das contas, Ivan transfigura-se de um pai normal que quer salvar sua família para um herói completo que busca ajudar todos, mesmo que isso lhe custe muito caro.
É justamente essa idealização do personagem que fez com que eu perdesse qualquer simpatia por ele e por suas motivações, chegando ao ponto de ficar entediado ao ler seus pensamentos e reflexões.



No geral, as Crônicas dos Mortos é uma série de livros que surpreende, inova e acrescenta muito no universo de zumbis. O autor consegue entregar ao leitor uma leitura simples e direta, onde os capítulos se encerram em questão de minutos. Ótimo livro, merecendo destaque para o novo nome nesse universo de horror e relacionados. Quem sabe ele não inicia uma nova obra focada estritamente ao terror?
 O que você acha? Comente aí embaixo.

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